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Grande Espírito Mãe, Pai, Vida. Onde nos perdemos de ti?


Grande Espírito Mãe l Pai l Vida Onde nos perdemos de ti? Para além do ruído dos dias há um chamado sem legendas. A Velha Montanha ainda sabe o meu nome. Eu venho de lá. Eu nunca saí de lá. As antigas Samodivas, guardiãs dos seus mistérios continuam vivas, eu sei, sinto-lhes o cheiro. O mundo ao longe permanece no seu sono e alienação profunda. Indiferentes, os burros, as vacas e as suas crias deambulam pelas bermas e no meio da estrada. Este é o seu reino. As pessoas deixaram para trás as montanhas, as pedras soltas das escarpas rochosas obrigam-me a uma gincana constante. Mas a beleza revelada no final de cada curva compensa qualquer medo. A civilização abandonou este espaço. Uma bênção no meio do caos. O GPS não conhece os detalhes do invisível, mas a minha alma sim. Finalmente o trilho. Montanha a cima, por entre árvores, pés guiados pela sabedoria orgânica das memórias celulares por entre pedras que se soltaram da mãe, e vagueiam encosta abaixo em demanda da aventura. O calor abrasador obriga à pausa. Os mosquitos entram-nos nos olhos a cada passo. O corpo queixa-se, mas a vontade é incontrolável. As únicas três pessoas que se cruzam connosco já desapareceram na floresta. Estamos sós, eu e o meu filho algures na montanha. Mais de uma hora depois a visão abre-se num voo sem precedentes. Lá está ela, a gruta que canta, a vulva, o ventre, o sagrado templo. Há lugares cuja magia é difícil de definir. O coração transborda e tece uma teia de emoções, mas as palavras atropelam-se num rio de lágrimas. Só um cântico, uma dança, um agradecimento, uma oração. Despedimo-nos, ela fica lá atrás olhando, vigiando, abraçando a imensidão do vale aos seus pés, e continuará a cantar a sua magia por muito, muito tempo. Está a anoitecer, é tempo de regressar. A última parte do trilho é habitada por árvores que se entrelaçam criando túneis por onde só caminhamos curvados. Os pés parecem conhecer cada pedacinho de terra, e conseguimos saltitar em segurança, encosta abaixo no meio da escuridão. Junto ao carro ainda há tempo para observar o alaranjado do poente em contraste com a silhueta negra da montanha do outro lado, para lá do vale que é também o leito do rio. A noite acorda as suas criaturas, e para grande alegria somos presenteados com as aves noturnas que fazem razia ao carro, com um coelho que fica parado a olhar para nós, com uma doninha que corre ao nosso lado e finalmente somos observados por uma raposa curiosa. Grande Espírito Mãe l Pai l Vida Como agradecer estas bênçãos? Como é possível não Te AMAR VIDA?

BULGÁRIA, Agosto 2020

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