Os dias da descida
Ela é a terra que pisas, a semente em gestação, o pó dos ossos, o humus-vida, a gruta negra, o mergulho no escuro, o calafrio no estômago, o canto que embala e adormece, o bafo quente das entranhas, a que corta, a que conta, a que tece.
Ela é a magia a reescrever as histórias. Nada lhe escapa, e nada lhe serve. Não carece de mais nada se não de si mesma, mas no seu manto de breu há um espaço onde te podes aninhar. Se a Ela te renderes, e a Ela te entregares, ele tece à tua volta finos fios, conexões ancestrais, radares ctónicos cuja linguagem saberás decifrar.
E quando num salto, num grito, num pranto, ou numa gargalhada Ela te parir de novo, conhecerás mais um recanto do mistério de que és feit@. Com um sorriso alegre, maroto, atrevido, extasiado, voltarás ao ponto de onde nunca saíste e onde nunca estiveste. A teia mostra-se mais um pouco, nunca tudo, para não estragar a beleza de não seres perfeit@.
Mizé Jacinto
Novembro 2019
Fotografia https://www.facebook.com/mariajosejacinto.photography/